Leiam com atenção a reportagem publicada pelo Conselho regional de medicina de São Paulo (CREMESP) em agosto de 2010, sobre nós PEDIATRAS.

Conselho avalia as razões da carência de pediatras no país

Relator do parecer de consulta enviada ao Cremesp, o vice-corregedor e conselheiro Clóvis Francisco Constantino, esclarece que a carência de médicos pediatras no mercado de trabalho tem múltiplas razões e que elas estão detalhadas no texto elaborado pela Sociedade de Pediatria de São Paulo – com relatoria de seu vice-presidente, Mário Roberto Hirschheimer – e subscrito pela Câmara Técnica de Pediatria do Cremesp no Parecer-consulta nº 101.660/2009, resumido abaixo:
O médico pediatra é, antes de tudo, um orientador com a responsabilidade de qualificar o desenvolvimento de um adulto capaz numa sociedade que se pretende mais justa. A realização desta tarefa exige competência, compromisso, lealdade, disponibilidade, vontade e tempo.

É um especialista que atua em todos os níveis de atenção à saúde: promoção, proteção e recuperação da saúde; e do processo de desenvolvimento com intervenções educativas, preventivas, diagnósticas e terapêuticas. No atendimento pediátrico devem ser levados em conta aspectos como estado nutricional, história alimentar, curva de crescimento, desenvolvimento neuropsicomotor, situação vacinal, acuidade visual e auditiva, saúde bucal, qualidade e quantidade de sono, entre outros parâmetros de saúde e desenvolvimento.
No atendimento das emergências e urgências pediátricas, o pediatra requer uma qualificação para atender inúmeras demandas e ser capaz de entender bastante (não tudo) de todas (ou muitas) as áreas da medicina, que lhe permite transitar com facilidade e qualidade, pelas enfermidades mais frequentes, resolvendo a grande maioria dos casos de modo adequado, ágil, mas sem pressa. Isto requer vigor físico e equilíbrio emocional.

Atualmente 80% das vagas nas residências médicas de pediatria são ocupadas por mulheres. Estas, obviamente conscientes da importância da mãe no crescimento e desenvolvimento de uma criança, reduzem suas atividades ao ter seus próprios filhos. Passam a não dar tantos plantões e a trabalhar em atividades de tempo parcial para poder se dedicar a eles.

“Pronto-socorrização” do atendimento
Com a incorporação da mulher no mercado de trabalho da sociedade contemporânea, o pronto-socorro passou a ser utilizado como um serviço de conveniência para as famílias. Lá, não se requer a marcação de consultas e há a expectativa de um atendimento ágil e resolutivo.

Tais famílias não levam em consideração que num pronto-socorro não ocorre um atendimento pediátrico adequado, pois é um tipo de serviço para reconhecimento e tratamento de uma condição clínica transitória e não para um atendimento pediátrico integral. Não há compromisso, no longo prazo, de quaisquer das partes entre si, que termina com o final do atendimento.
Aliado ao sacrifício de ter de trabalhar nas madrugadas, finais de semana e feriados e à insegurança em muitos locais de trabalho, tal condição vem contribuindo para uma progressiva frustração e fadiga profissional, afastando muitos pediatras da especialidade.

Diminuição do interesse pela pediatria

Deve-se ressaltar que a pediatria continua sendo uma das maiores especialidades médicas. Estima-se que, no Brasil, existam hoje cerca de 36 mil pediatras. Entretanto, de 1997 a 2009, a progressão da procura da pediatria pelos formandos em Medicina sofreu uma brusca mudança. De 1997 a 1999 houve um aumento, mas a partir de então teve uma queda de 50% dos candidatos ao Título de Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria; e de 55% daqueles considerados qualificados para tal (aprovados no concurso), mostrando, inclusive, uma piora na qualificação para o exercício desta especialidade.

Remuneração justa do profissional médico

Para atender adequadamente um paciente, o médico necessita ter uma qualidade de vida para evitar que leve seus problemas pessoais para o trabalho. Uma melhora na remuneração dos médicos reduziria a prática de trabalhar em vários hospitais para adaptar o orçamento, pois essa forma de trabalho acaba esgotando o profissional, o que se reflete no tratamento dos pacientes, pois ele não tem tempo para se atualizar como deveria e oferecer uma melhor assistência.

O novo Código de Ética Médica, em vigor desde 13 de abril de 2010, no seu Capítulo I – Princípios Fundamentais – Inciso III diz: “Para exercer a Medicina com honra e dignidade, o médico necessita ter boas condições de trabalho e ser remunerado de forma justa” e, no inciso XV: “O médico será solidário com os movimentos de defesa da dignidade profissional, seja por remuneração digna e justa seja por condições de trabalho compatíveis com o exercício ético-profissional da Medicina e seu aprimoramento técnico-científico”.
Uma das razões para a atual situação de falta de pediatras é a ausência de uma política responsável de recursos humanos que seja aplicada aos médicos do serviço público.
É oportuno comentar que vem ocorrendo um aumento da oferta de empregos para pediatras em virtude da necessária implantação de unidades de terapia intensiva (UTIs) neonatais e pediátricas, considerando a ainda carente oferta dessas modalidades de assistência à população.

O que acontece com a especialidade é um fenômeno de mercado de trabalho, relacionado principalmente à remuneração dos profissionais. Como não existem procedimentos que acrescentem remuneração ao atendimento pediátrico, uma vez que a pediatria é essencialmente uma especialidade clínica, outras áreas têm atraído os jovens médicos. Isso denota a falta de visão do sistema de saúde com os atendimentos primário e secundário. Não existe uma remuneração adequada e não se oferecem condições dignas de trabalho. Nem um plano de cargos e salários adequado na rede pública.Em relação ao pediatra brasileiro, nota-se uma diminuição da autoestima, trabalhando com baixos salários e em condições inadequadas.
Foi preciso acontecer uma carência de pediatras para preencher as vagas necessárias para um atendimento mínimo para o problema ser discutido e chamar a atenção dos responsáveis pelas políticas de saúde. A lei da oferta e da procura funcionou e hoje se procuram pediatras nos serviços públicos e privados.Embora a remuneração do pediatra tenha melhorado no último biênio, isto só ocorreu nos prontos-socorros e UTIs de serviços privados, absorvendo a quase totalidade dos profissionais que estão ingressando no mercado de trabalho.

A criança brasileira tem o direito à assistência médica pública e eficaz, assegurado pela Constituição Federal (Artigo 227), sendo dever do Estado prover os mecanismos para que os recursos direcionados à saúde sejam otimizados em seu benefício. Estabelecer vencimentos dignos para médicos do setor público faz parte desse dever, considerando que é mais econômico remunerar um bom médico do que gastar ao remediar.

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